terça-feira, setembro 30, 2025

passo e ando

A cada verso 
vou repetindo o mesmo
 hiperfoco indefeso

 da duna 

Os sambaquis sob igrejas

O poema sem rumo

Por aqui
Embaixo do couro
Corpo do poema
No passo
Da Ema

Lá e ló

Lá no meu sertão

Todo passo avoa

Lá e ló

Só a ema não...

E piu, piu e piu

Coma milho, passo...
Coma milho...

Poema, passo
Da Ema 

Emaemaemaê...
Omaemaaemamá

Passeando no passo
Passo e ando

gaza

Meu verso defesa
Se não falo em Gaza
E já não é poesia
É agonia
Sem nome

Dizer indizível 

sobre poemas viventes

Quando a poesia some
Na miséria dos afetos
Desafetados
Poesia paupérrima 
Dos sentires maléficos
Dos espíritos apagados

O verso tenta nascer 
Se esgueirando 

Mas à frente,
Um verso vívido
Desenha a paisagem 
carregando água
Na miragem

verso suado
Na quentura do dia
Intenso, no olhos videntes 
Sobreviventes e inéditos
Às telas frias



terça-feira, setembro 02, 2025

poema pra Minha irmã Luana Regina

LUA REGINA 

Queria fazer um poema
Mas o verso some
Diante da Lua

Sob ela, pequeno fica o verso
Só grandeza prateada
Iluminando a noite
Mexendo as águas

Na mata, uma renda
Que ela tece
No lago espelha
Sua face

E cresce, e some
Em seus disfarces
De sereia, e de felina
De Regina

quarta-feira, agosto 06, 2025

se o verso não traz criticidade

Jornalismos que escondem a noticia
Em Defesa total do capital
Relegando à miséria abisal
Pobre e preto que é presa da polícia
Onde a ordem que impera é a milícia 
Onde ao ódio se faz apologia
"Pátria, Deus e familia"... Hipocrisia
Onde há filtros encobrindo verdade
Se o verso não traz criticidade
Para mim não existe poesia

A criança agradece ao soldado
Pela esmola que leva de farinha
Mais a frente no tempo vem a linha
De um tiro que agora lhe é dado
Um menino ali tão educado
Inocência comida em forma fria
É liberto da carne à revelia
Pela draga que é sem saciedade
Se o verso não traz criticidade
Para mim não existe poesia

Para mim o poema se desfaz
Se não há nesse verso um peito aberto
Nós devemos lutar pelo que é certo
Não apenas olhar o que lhe apraz 
Pensar só no umbigo, nada mais
É tão triste e dá muita agonia
Não somente pensar na sua cria
Toda cria merece caridade
Se o verso não traz criticidade 
Para mim não existe poesia

É poema pra mim cotidiano
Os exemplos que vemos solidários
Atos simples transcorrendo diários
Auxiliam viventes nesse plano
As garrafas jogadas no oceano
Suprimentos que trazem alegria
Gratidão por comer por mais um dia
Um mergulho no mar da amizade
Se o verso não traz criticidade
Para mim não existe poesia

Um poema se faz a cada instante 
Que a gente se abre pra sentir
Compaixão nos começa à conduzir 
Emoção que transborda e é constante
Se a gente de si está distante 
O silêncio deprime e tapa a via
Um poema entalado não se cria
Corpo soma toda toxidade
Se o verso não traz criticidade 
Para mim não existe poesia

Tantos versos ceifados sem refrão 
O silêncio ao horror dando lugar
A tendência é a gente se fechar
Ao sentir doloroso, dizer não
Encontrando pra isso uma razão
Relegando a rasura da grafia
Impotência dá canto à apatia
Ou descrê ou se apega a divindade
Se o verso não traz criticidade 
Para mim não existe poesia

É difícil escrever se a dor transpassa
A expressão é arreia a flutuar
Pés descalços buscando caminhar
Entre pedras e corpos se esgarça
A espera meada de desgraça 
Se expõe à oposta artilharia
Tremular esperanca, epifania
Frente à dura e fatal realidade
Se o verso não traz criticidade 
Para mim não existe poesia

Não existe um povo escolhido
Nem tem terra que é santa e outra não
Eles tentam usar a religião 
Pra esconder o verdadeiro sentido
Encobrir o seu plano pervertido
Puro suco nazista, de eugenia
Extremo extrativismo que sorvia
Peles, órgãos, bebês de pouca idade
Se o verso não traz criticidade
Para mim não existe poesia



segunda-feira, agosto 04, 2025

pendurado

Chuva nessa manhã amarela
de 4 de agosto
Pós feriado na vitória

Agosto de Deus

Manjericão parece vingar
Tempo incerto

Roupa no varal
E o tempo pendurado



domingo, julho 06, 2025

Sertões

Dia amanhece em sonho
Carro buzina lá em baixo
As galinhas
Passarins 
Moto

Dia chegando
Posso ouvir o bem-te-vi 
E um automóvel que voa

Penso no dia poeira
Nas tendas da Palestina
As crianças heroínas
pássarins 

O verso do carro pipa
Da minha infância salobra
Reverberando sim

Da casa pedra aos destroços 
Escuto a gente brincando
Na rede, tenda, balanço
Ainda, assim

Enquanto as memórias persistem
Algo cintila
Solar

Agua viva no alumínio 
Dedo verde enraizando a terra
Gata, cachorro, cabra, galinha...

Mainha viva
sentada no chão
Pintando um banco
Contando memória 

Mainha céu que unia
Mundo de crianças 
Mão de afeto e sertão


eclipses

Escrevo sem tinta
Sem alarde 
Mas ainda assim
A escrita fugaz das telas
Fica aqui, mas logo some
Nos mecanismos 
Digitais

Escrevo apagada
Como quem some
Entre escombros

Tento escrever sobre
Essas,  aquelas almas
Corpos que vejo nas telas
E aqueles que sequer vejo
Que somem com suas memórias
Pelos ares, na poeira

Uma criança que pergunta ao tio
"Meu pai inda está vivo?"
Ao vê-lo no chão amarelo
Ao tentar buscar comida
A falsa ajuda
que nada tem de humanitária 

Um cotidiano de cenas

A rima ao som entoado
Dos palestinos que cantam
Apesar dos sons de morte 

Solares,
Trazendo eclipses
Nas luas de seus versos

 

segunda-feira, junho 30, 2025

são pedro

Vim fazer um poema junino
São Pedro fechando o mês
Fazer então um poema
Como quisesse que junho
se expandisse ao ano inteiro
E Junho passou ligeiro
No tempo meu que tá lento
Junho passou avexado
Nesse friozinho de vento 
Nem deu pra sentir o gosto
De tudo que junho traz
São Pedro fechando as portas
São Pedro mandando chuva
São Pedro ficando atrás 

Sigo enrolada nas mantas
Como em junho prosseguisse

São Pedro na flor do cacto
São Pedro fruta da palma
São Pedro mandando chuva

São Pedro fechando as portas
E o junho frio aquecendo
Dentro da casa da infância 
Dentro da gente tecendo

São Pedro no fim de junho
São Pedro e junho no fim

Na vontade de café
Na vontade de um cházim
No Gengibre, na Hortelã 
No milho,  no amendoim
canela, açucar, maçã 
Rapadura e alfinim

São Pedro mandando chuva
La em cima abrindo as nuvens
Fechando as portas do tempo

As porteiras, os portões
Arrematando o que é denso
Nas bandeiras coloridas
Umedecendo os lamentos
Agua infiltrando paredes
O pedregulho, a latada
Escorrendo pelas ruas
No meio fio, das calçadas

São Pedro gavião de pedra 
E lavandeira de água
No coração de São Pedro 
Um cacibão no lagedo

Antonio, São João, São Pedro







quinta-feira, junho 05, 2025

não quero ser a poeta triste

Não quero ser 
a poeta triste
que os outrxs 
reparam com pena

Quero a coragem
dos que sonham
E acreditam

Não quero 
um delírio-precipício 
Espatifado na queda

Quero a coragem
dos pés
Buscando o chão nutriz
Enraizando o sonho
Na terra

Eu quero a coragem
Dos que amam 
E profetizam
O amor
Na vera

Aqueles que fazem a hora
Que criam à história
Surfando os medos

Quero criar barcos
Pontes, e cafés bibliotecas
Lugares de conversa
De olhos
Nos olhos

Alimentar o analógico
O desplugado
Carregar-se do outro
Escuta, ombro, colo
Abraço 

Mãos dadas
Ciranda na praia
Banho de mar
Energia do Sol

Quero ser fresta
Onde estiver
Que esteja
bem firmemente encarnada
Pra trocar

Dar e receber
as narrativas 
do mundo
E o desmundo
Mundovirar