quinta-feira, novembro 14, 2019

No caminho do mar tinha flor e cura

Mote de Tonfil

Inquietante pensar
Que o desamor possa haver
Que mal se possa fazer
Que a vida possam roubar
A beleza violar
Mudando o rumo da estrada
Essências violentadas
Perguntamos até quando
Eu vi as plantas velando
Mil flores despetaladas

Sob leis eclesiais
Hipocrisia imperante
Alguns direitos vitais
Tomaram tom dissonante
O proscrito e o errante
Voz que quiseram calada
Sabedoria queimada
Em fogo se transformando
E a natureza velando
Mil flores despetaladas 

Mil flores despetaladas
Estrada e terra que voa
Espinhadeira corroa
Na Crística caminhada
Porém a nossa pisada
Tem passo forte de estado
Caminho abençoado
Pela mãe compadecida
Que gera, cuida e dá vida
Ao que outrora foi velado.

A força do feminino
Nos encoraja na fé
A graça de ser mulher
E entoar nosso hino
Um encanto peregrino
Entorna a face cansada
Sabedoria sagrada
De uma verdade se dando
Mil flores desabrochando 
Na consciência da jornada

Nasceu de mim dois mistérios
Duas riquezas carnais
Brisas espirituais
Desceram dos céus etérios
Pensamentos deletérios
Já não sustentam morada
Abranda a dor esgarçada
Em parto pleno se dando
Pedra e mar desaportando
Dessa flor desabrochada

Um mareio encarnado
Veio esgarçando a fresta
Serena sua seresta
Sereno o seu estado
Sereias em seu legado
Um rio virando mar
Um uivo soa lunar
Na voz de todos os santos
Mil bruxas saúdam o encanto
De seu retorno para cá





segunda-feira, setembro 30, 2019

Fluxo d'água corrente

Na foz do meu peito preso

Mora um grito excluído

Silencioso estampido

Calado parece ileso

De animal indefeso

Deu-se em fera encarcerada

Sob a lua enevoada

Sonha a ancestral serpente

Fluxo d'água corrente

Correnteza em retomada


Dou um grito de terror

Sofrendo a dor de outrxs tantos

Ouço os tambores dos Bantus

Aos ancestrais dou louvor

Encontro em mim o sabor

Que havia esquecido

Do genipapo moido

Uma memória que sente

Fluxo d'água corrente 

Sob o veio ressequido


Queria encontrar alento

Um colo e um cafuné

A força de ser mulher

Novamente achar intento

Mas parece que o momento

Me Impele à solitude

Sigo o som de um alaúde

Que guia em tom diferente 

Tento ser resiliente

Achar no nada a virtude


Um rio reinventado

Passeia no meu trilhar

Círculo o mesmo lugar

Entre pedras o meu nado

Podia ser meu agrado

Lagoa sem movimento

Em cada peixe um lamento

Como se fosse pra gente

Fluxo d'água corrente

No despertar do momento





sexta-feira, agosto 09, 2019

ela

Na tarde que ela chegou
Estampiu-se ela de mim
Feito uma filha real
Uma outra a banhou
A trouxeram embrulhada
Silenciosa buscou-me
No sentido do seio
Estive acabada

Fui cortada ao meio

quinta-feira, fevereiro 21, 2019

Omar

Omar desceu girando do cosmo
Se esparramou entre as frutas da Ceasa
Com as marés nos olhos nos espumou como as bebidas curtidas
Sábio de antigos desertos
De certo um imã, um irmão
No nome o som da criação criança, da graça
Os lábios do doce das tâmaras místicas alucinadas do Saara
Canção de oásis seu peito
Solto entre as palmeiras que abanam o tempo
Pés nas alpargatas, nas areias, nas estrelas, nos passos, nos Caminhos, no claustro, nos abismos, na amplitude, no vôo

Gemido arabesco de pássaro

Omar retorna conosco, somos gratos
Honrados com a sua majestade simples
Dou-te o veludo do meu leite e colo trigueiro
Te aninha em mim, ave santa
És, junto á Esmeralda, o tesouro antigo
Que entre mistérios minou
Gemas sementes tomadas pelo sopro
Dois milagres

terça-feira, fevereiro 05, 2019

Casa

Faltam as palavras
no espelho distante
Cintila a louça do frágil
Cavalga a força solta
com a cria pelo mato
Na busca de chão
os ladrilhos resistentes e belos
Existe um elo apagado
Um pulso ancorado
Um grito embotado
Na minha casa brotou uma mata
Os espíritos de ferrão defendem a ruína
Por toda parte há estilhaço
Como se a casa estivesse nas entranhas
me habita uma borboleta de madeira com cheiro de chuva
Ouço dentro o som da panela que ampara essa goteira antiga
Ouço a louça frágil
Como uma guerra que findou
sem socorro
Com os olhos secos
A vista traga mormaço
O vento cisca as telhas
Esfrego as janelas
Casa assim é palavra difícil

Mata

Na minha casa cresceu uma mata
Enxames guardiões e aves
Venho pra essa casa
Mergulho sua essência
No quarto das armas Omar dorme
Busco me desarmar
Bosque de abundância
Medro entrar